Marcelo Oliveira
As comemorações dos cem anos de história da fundação da Sociedade Beneficente Israelita de Santa Maria foram realizadas neste fim de semana. Na sede da instituição, a Sinagoga Itzhak Rabin, foram reservados momentos de orações, reflexões e discussões sobre a preservação do acervo histórico dos judeus na cidade e o antissemitismo no mundo. Na manhã de domingo, em momento de emoção, foram visitados os cemitérios israelitas no Bairro Chácara das Flores e no município de Itaara.
– Nos demos conta que estávamos a 100 anos da fundação da nossa sociedade, que foi quando os judeus começaram a se estabelecer em Santa Maria, depois da estada breve em Philippson. É uma data que não podia deixar de ser festejada. Nós queríamos que fosse algo memorável, que marcasse todos nós. Estamos muito felizes – celebra Miriam Seligman de Menezes, 69 anos, presidente da comissão organizadora das comemorações.
Cemitério Israelita em Santa Maria
O Cemitério Israelita, em Santa Maria, fica no Bairro Chácara das Flores desde 1924
No começo do domingo, mesmo com os termômetros marcando 2°C no Bairro Chácara das Flores, cerca de 50 pessoas foram até o local prestar homenagens aos antepassados que foram sepultados no Cemitério Israelita, que existe desde 1924. Em vez de flores, como é o costume cristão, pedras foram colocadas sobre os túmulos. Para os judeus, isso é uma prática comum – posicionar uma pedra no túmulo de um ente querido como sinal de que o local foi visitado. A pedra deixada é um sinal de que a memória da pessoa ainda vive. Quanto mais pedras houverem sobre o túmulo, mais honrada e respeitada a vida da pessoa falecida foi.
A pedra deixada é um sinal de que a memória da pessoa ainda vive
Para os judeus, posicionar uma pedra no túmulo de um ente querido é uma prática comum
– Isso é um retorno às nossas raízes. De certa forma, chegamos a ver nossos antepassados, pelo legado que eles nos deixaram. É prestar um tributo, honrar nossas antepassados. Isso, no judaísmo, é uma lembrança das grandes ações que a gente faz – afirma o médico Robert Shmulerg, 54 anos, que deixou Santa Maria há três décadas.
Robert Shmulerg, médico de 54 anos, à direita, afirma que a homenagem aos antepassados é uma característica marcante do judaísmo
Para o professor aposentado, o argentino Silvio Ernesto Szewkies, 76 anos, que escolheu Santa Maria como morada, a visita ao local foi ainda mais especial. Apesar de não ter ancestrais enterrados no cemitério israelita da cidade, foi ele que ajudou a escrever alguns textos nos túmulos que ali estão, pela sua habilidade com a língua hebraica:
– Muitas pessoas que estão aqui eu conheci em vida frequentando nosso templo, nossa Sinagoga. Tive a honra de auxiliar nas escritas de alguns dos túmulos que estão aqui. A gente ajuda a manter a chama viva do judaísmo no que a gente pode, ressalta o professor aposentado.
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A cerimônia foi encerrada com uma oração em homenagem aos antepassados que foram sepultados no Cemitério Israelita, no Bairro Chácara das Flores.
Cemitério Israelita de Philippson em Itaara
O Cemitério Israelita de Philippson em Itaara é patrimônio histórico estadual desde 1994
A última atividade que marcou as comemorações do centenário da Sociedade Judaica de Santa Maria foi a visita ao primeiro cemitério judaico do Rio Grande do Sul, patrimônio histórico estadual desde 1994, o Cemitério Israelita de Philippson, em Itaara. Foi nesse local que chegaram as primeiras famílias judaicas, em 1904. As lembranças e as histórias emocionaram o professor Milton Seligman, 70 anos:
Milton Seligman não conseguiu segurar a emoção ao lembrar as circunstâncias que fizeram com que as primeiras famílias judaicas viessem para o país
– Aqui, é um pouco do fio condutor de toda presença judaica no Rio Grande do Sul, que é numericamente pequena, mas muito integrada ao desenvolvimento do Estado e da região. Quando você lembra que essas pessoas chegaram aqui, imagina, expulsas dos lugares de onde saíram, não vieram para cá numa imigração espontânea. Eles foram expulsos pela fome, pela perseguição, e encontraram aqui um país de braços abertos. É muito emocionante e comovente – descreve o professor Milton Seligman, não conseguindo segurar a emoção.
Orações encerraram as homenagens e comemorações do Centenário do Sociedade Beneficente Israelita de Santa Maria
Assim como no cemitério de Santa Maria, os participantes fizeram um momento de oração e homenagem aos antepassados, que foram os primeiro imigrantes judeus que vieram de forma organizada para o Brasil.
História
O cemitério de Philippson possui cerca de 80 túmulos, em uma área aproximada de 1,2 mil m².
Em 1904, 38 famílias foram morar no local. O projeto agrícola não se desenvolveu como esperado e, aos poucos, os imigrantes deixaram a fazenda, estabelecendo-se em cidades como Santa Maria, Porto Alegre e Passo Fundo.Após alguns anos, partes da área da colônia de Philippson foram vendidas para a Brigada Militar e para o Exército Brasileiro. O restante das terras permanece até hoje em propriedade de descendentes dos primeiros imigrantes.
Palestras
A programação do centenário da fundação da sociedade também contou com a realização de palestras na sede da instituição, a Sinagoga Itzhak Rabin, no centro da cidade. O primeiro encontro trouxe a reflexão sobre a importância de se preservar o acervo histórico, para valorizar e manter a história da sociedade judaica cada vez mais viva.
Palestras abordaram a importância da preservação do acervo histórico e o antissemitismo no mundo
– Trata-se de um recorte da sociedade judaica de Santa Maria, a partir dos itens que nós temos no Instituto Marc Chagall, em Porto Alegre, que é basicamente o grande arquivo de memória da comunidade judaica no Rio Grande do Sul. Este é um momento especial que só ocorre de 100 em 100 anos – ressalta Rafael Bán Jacobsen, presidente do Instituto Marc Chagall, 41 anos.
A segunda palestra debateu o antissemitismo na atualidade, que simboliza o preconceito, a hostilidade ou a discriminação contra judeus.
Produção: Mirella Joels, [email protected]
José Quintana Jr, [email protected]
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